de Fernando Martins
Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 30 Abril , 2009, 18:04
D. Manuel Martins

Frei Nuno de Santa Maria foi finalmente canonizado.
Este acontecimento não mereceu grande atenção a boa parte dos portugueses, sobretudo a nível dos responsáveis do país e de alguns dos meios de comunicação social.
Não vem para aqui a questão dos milagres exigidos pela Congregação para a Causa dos Santos.
Adianto só que, com todo o respeito pelas disposições da Igreja, julgo sinceramente que tais milagres não deviam funcionar como condição para a glorificação dos cristãos.
Além de saberem a tentação de Deus, acontece que muitos deles não convencem. Já D. António Ferreira
Gomes, nas célebres “Cartas ao Papa” põe clara e corajosamente esta questão. A Igreja, quero dizer mais propriamente, a Comunidade dos cristãos sabe bem quem é santo e merece, por isso, ser glorificado. Ao que vêm tantos exames aos escritos, ao que vem a audição de tantas testemunhas, ao que vem a perscrutação dos sentimentos do povo relativamente a este ou àquele cristão que viveu e morreu com fama de santidade?
O nosso Frei Nuno há muito tempo que estava canonizado pelo povo.
Quem olha atentamente para a nossa História do século XIV não terá dificuldade em reparar que Portugal estava a perder a alma, estava a fugir de Portugal. E foi o Condestável D. Nuno que deu
Portugal a Portugal, que fez com que Portugal se reencontrasse e pudesse assim perspectivar futuro.
Sem D. Nuno, Portugal seria uma apagada lembrança da memória.
Se calhar, até seria bom que parássemos um pouco para nos perguntarmos se o Portugal dos nossos dias não andará a fugir novamente de Portugal, se Portugal não andará por caminhos que o levem a perder a sua alma e a sua identidade.
Bastaria para tanto pensar em leis que atentam contra a família, contra a vida, contra tantas situações que têm a ver com o humanismo que deveria acompanhar situações de saúde, de trabalho, de educação de justiça, de respeito por valores e tantas coisas mais. Portugal está a afastar-se da sua matriz. Melhor, por razões de falso e perigoso poder, por razões ideológicas e filosóficas, muitos estarão a obrigar Portugal a fugir da sua matriz.
Claro que os tempos vão mudando e operam-se transformações profundas na sociedade. O ontem pertence à história e muitas vezes não fica dele senão uma amarga saudade. Mas, o que nos fez e faz não pode mudar. O que nos estruturou e estrutura não pode mudar. Estamos numa hora magnificamente exigente. Oxalá sejamos capazes de a apanhar como se impõe.

Manuel Martins,
Bispo Emérito de Setúbal

Editado por Fernando Martins | Segunda-feira, 27 Abril , 2009, 21:30

1. Corria o ano de 1360, a 24 de Julho, segundo os historiadores em Cernache do Bonjardim nascia Nuno de Santa Maria. Aos treze anos torna-se pajem da rainha D. Leonor, sendo acolhido na corte e acabando pouco depois em cavaleiro. Quando da morte do rei D. Fernando I (a 22 de Outubro 1383), sem ter gerado filhos varões verifica-se o vazio no poder, a que seu irmão D. João Mestre de Avis responde envolvendo-se na luta pela coroa pretendida pelo rei de Castela. Os contextos difíceis da história da época de trezentos, sofrendo de profundas mazelas e de grave crise social, reclamavam visões e posturas claras de defesa da identidade e do património nacional, não que tal represente com os olhos de hoje um nacionalismo cego mas um dever de zelo comunitário inalienável.
2. Nuno Álvares Pereira toma o partido da defesa da nacionalidade no proteger D. João, o qual o nomeou Condestável, estratega e comandante supremo do exército, missão que levou a efeito com sucesso registando-se a 14 de Agosto de 1385, ao fim de muitas, a simbólica vitória de Aljubarrota que poria fim à crise da sucessão. Faz parte da história e da identidade dos portugueses – mesmo que sem mitologias – que, com a chegada de D. João I à coroa, se inicia uma nova era no desígnio das gentes da costa ocidente europeia, facto este (da base de sustentabilidade para o encontro de culturas operado nas descobertas) que também muito se deve à educação em valores universalistas dada aos filhos de D. João e Filipa de Lencastre. Um conjunto de valores e de confianças perpassaram nas gentes da época que, à semelhança de Nuno e D. João, terão sido pilares da edificação comunitária.
3. Muito se escreveu e se disse, nos vários prismas, sobre o acontecimento que no passado domingo elevou à santidade o militar com alma, apelidado na sua morte de “Santo Condestável” (Páscoa de 01-04-1431). Apurar a memória também será “desatar” alguns dos problemas actuais!

Alexandre Cruz

Editado por Fernando Martins | Segunda-feira, 27 Abril , 2009, 19:29


Em seis séculos, o Condestável perdeu capacidade de mobilizar o país e a Igreja. O homem a quem se reconhecem virtudes éticas mesmo na guerra e que foi capaz de renunciar a títulos e bens para andar descalço por Lisboa a pedir para os pobres não criou agora, com a sua canonização, grandes entusiasmos por parte do Estado, nem dos católicos. Esse vazio foi, aliás, ocupado (legitimamente) por sectores conservadores da Igreja e pela causa monárquica.
Certo que o acontecimento de ontem era religioso. Mas quando o Estado se associa com entusiasmo a celebrações de futebóis, causa estranheza não ver mais empenho em relação a uma figura que marcou a História do país - para o bem ou para o mal, admitam-se as opiniões.
A Igreja também não foi capaz ainda de vincar um discurso rigoroso e actual em relação ao novo santo - as duas intervenções do Papa, ontem, são disso exemplo. A hagiografia tem oscilado entre a "exaltação patriótica" do militar - que o patriarca de Lisboa teve a preocupação de rejeitar - e as virtudes e histórias que às vezes se confundem com lendas. Como dizia o cardeal Policarpo, faz falta que a história investigue mais a figura do Condestável. Falta outra coisa, que a canonização evidenciou: o segredo em que os responsáveis católicos colocam os processos das curas que permitem as beatificações e canonizações não ajuda a dar credibilidade a tais acontecimentos. Sentiu--se isso com a beatificação dos videntes de Fátima, sentiu-se de novo agora.
Ontem, o cardeal Saraiva Martins declarava-se "feliz" pela conclusão do processo, após "tanto trabalho" que teve para concluir em três meses o que levaria "cinco a seis anos". Ora, as dúvidas surgidas em tantos sectores da opinião pública (incluindo a católica) não podem ser olhadas de soslaio pelos responsáveis da Igreja. Para que os santos sejam mesmo modelos para quem os quer seguir.

António Marujo
27.04.2009

Editado por Fernando Martins | Sexta-feira, 24 Abril , 2009, 18:23

Guilherme d'Oliveira Martins diz que é «tempo de olhar a figura, em si, para além de equívocos e de aproveitamentos» em volta da canonização

À primeira vista há quem manifeste perplexidade. Porquê falar de Nuno Álvares Pereira em pleno século XXI, e ainda por cima como referência religiosa? Porquê homenageá-lo como referência cristã?

A dúvida tem, no entanto, muito menos a ver com a personagem histórica e com o seu significado, do que com a sua escolha em diversos momentos (cuja recordação está viva) em nome de uma relação equívoca entre o Estado e a Igreja ou de uma relação na qual havia quem desejasse que as fronteiras não fossem nítidas – como em tempos da pré-história da liberdade religiosa, distantes de uma laicidade serena e criadora.

É, pois, tempo de olhar a figura, em si, para além de equívocos e de aproveitamentos. Não há, assim, razão para associá-la a um nacionalismo desajustado dos sinais dos tempos de hoje, nem para a ligar a um patriotismo fechado e retrógrado, que Nuno Álvares Pereira nunca assumiu. É que aquilo que muitas vezes vem à memória não é a memória autêntica do herói e do santo, mas são as referências mais recentes de um tempo em que o Condestável foi usado como bandeira de causas de isolamento e de auto-comprazimento nacional…

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Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 16 Abril , 2009, 12:38

A propósito da canonização do Condestável D. Nuno Álvares Pereira, o Cardeal José Saraiva Martins, português e radicado no Vaticano, onde desempenhou até há pouco a responsabilidade da Congregação para a Causa dos Santos, concedeu uma entrevista à Ecclesia, que vale a pena ler.

Editado por Fernando Martins | Sábado, 21 Fevereiro , 2009, 17:56

O Papa Bento XVI anunciou hoje a canonização este ano de dez beatos, entre os quais o carmelita português Nuno de Santa Maria Álvares Pereira, segundo um comunicado do Vaticano.
Nuno Álvares Pereira integra, ao lado de quatro italianos, o primeiro grupo, que será canonizado no próximo dia 26 de Abril. Os quatro italianos são o padre Arcangelo Tadini (1846-1912), fundador da Congregação das irmãs operárias de Sagrada Família, a religiosa Caterina Volpicelli (1839-1894), fundadora da Congregação das Ancelles do Sagrado-Coração, o teólogo Bernardo Tolomei (1272-1348), fundador da Congregação do Mont-Olivet, e Gertrude Caterina Comensoli (1847-1903), fundadora das Irmãs Sacramentinas.
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