de Fernando Martins
Editado por Fernando Martins | Terça-feira, 20 Outubro , 2009, 09:11



O sol despede-se lentamente nos dias cada vez mais breves de finais de Setembro. Esmaecem os doirados cabelos de Apolo. E as vinhas, os milheirais, os grandes plátanos dos jardins das cidades amolecem em tons amarelados e sanguíneos.

É o tempo das colheitas. Das vindimas e da apanha da fruta. Arrancam-se as batatas dos lameiros. Debulham-se os cereais. Descasca-se a amêndoa e secam-se os figos. A terra entrega generosamente ao homem o resultado do seu trabalho. Chegam as primeiras chuvas e despedem-se as aves migratórias. Límpidos horizontes. O mar, desocupado, exprime agora toda a brancura das suas ondas. Um cão vadio que corre atrás das gaivotas. Um par de namorados sentados na areia da praia. Avança o outono por Outubro. Desprendem-se as primeiras folhas. Pelos campos queimam-se as ramas secas. E o fumo levanta-se numa liturgia final de um ciclo que se encerra. Terminaram as últimas romarias do ano. Depois de Nossa Senhora dos remédios de Lamego, é a Feira das Colheitas em Arouca e S. Mateus em Viseu. Vem aí Novembro com as castanhas e o vinho novo. As árvores cada vez mais despidas. Os insectos entontecidos. E os primeiros frios de uma noite que se torna mais longa e ávida.

Revolvemos os armários em busca de roupa quente. O sono aumenta. Depois das beladonas, florescem os crisântemos e acorremos ao cemitério para recordar os nossos mortos. Chove muito. E lembro-me muito de ti ao cair da tarde. Não consigo evita este roxo, esta ansiedade, este advento que me conduz a Dezembro e ao nascimento de uma luz que auguramos desde o princípio do mundo.

Deslizamos por outono docemente e na verdade esta convulsão meteorológica e natural parece afinar-nos a sensibilidade. Os amanheceres breves e límpidos, com fiapos de nuvens avermelhadas atravessados pelo primeiro sol, são inesquecíveis, como aquela árvore cor de fogo, hirta e soberana que parecia reunir toda a luz do entardecer e que eu te pedi que fotografasses, naquela viagem para o longínquo norte.

Manuel Hermínio Monteiro (1952-2001)
Foto: BSPI/Corbis

Fonte: Umbrais

Editado por Fernando Martins | Quarta-feira, 12 Dezembro , 2007, 17:54

Largo de São Braz

No largo de São Braz
a vendedora de castanhas
sorria os dentes podres
e patos marrecos
dançavam a dança dos mancos


No largo de São Braz
as crianças adormeciam
nos ramos das árvores
e os cães vigiavam as pombas


O largo de São Braz
era muito pequenino
e não era largo

As pessoas eram muito felizes
porque se sentavam no chão
e cruzavam os braços

Quem me dera voltar
ao largo de São Braz


Orlando Jorge Figueiredo

Editado por Fernando Martins | Domingo, 09 Dezembro , 2007, 11:55




PRAIA DA BARRA
Vou à Praia da Barra desde que me conheço. De Verão ou de Inverno. Na Primavera ou no Outono. Todas as ruas, mesmo as mais recentes e fruto de uma urbanização com base no cimento armado, me são familiares. De tal modo que, quando passo, é frequente encontrar gente conhecida. De perto ou de longe. Hoje, com ameaças de chuva, lá fui mais uma vez. Com o Farol da Barra a dominar a paisagem desde há uns cem anos. De qualquer canto, ele desafia-me a fixá-lo na minha máquina. No areal deserto, nem marcas de gente havia. E mais ao fundo, a boca da barra dá passagem a navios que entram e saem constantemente. Quer chova quer faça sol. Num contínuo movimento que renova a paisagem a cada olhar.



Editado por Fernando Martins | Quarta-feira, 05 Dezembro , 2007, 10:43

ILHA DE SAMA OU ILHA DO REBOCHO
As tecnologias fazem por vezes quase o impossível. Na Gafanha da Nazaré, junto ao Porto de Pesca Longínqua, vê-se ao longe a célebre Ilha de Sama, também conhecida por Ilha do Rebocho. O que mal se vê ou vê mal a olho nu pode ser ampliado por qualquer razoável máquina fotográfica. O que fica, nesta fotografia, é uma imagem do abandono a que foi votada a ilha. A casa em ruínas dá a sensação de que é filha de guerra ou de puro esquecimento. Numa zona turística talvez a ilha pudesse ser devidamente aproveitada. Outrora foi propriedade agrícola, não sei se muito ou pouco produtiva. Mas tinha alguma vida. Hoje, está em agonia plena.

Editado por Fernando Martins | Terça-feira, 04 Dezembro , 2007, 16:58




Gafanhão que se preze não passa sem navios. E se não puder navegar, não resiste a passar por onde eles estão, como que a descansar das labutas no mar alto. Nos portos de pesca, na Gafanha da Nazaré, há sempre navios à espera que os gafanhões, e não só, os apreciem. Ontem por lá andei a contemplar estes bravos que, com homens valentes, enfretam, por vezes, a brutalidade das ondas marinhas. Mas também pensei no que foi a frota portuguesa antes da entrada na UE. A mais importante e mais dinâmica do País ancorava na Gafanha da Nazaré. Agora... é melhor pensar que um dia ela poderá regressar.





Editado por Fernando Martins | Segunda-feira, 03 Dezembro , 2007, 20:23




O Forte da Barra, em dia de Outono frio e húmido, não deixou de ser agradável à vista. Passei por lá e registei estas imagens que partilho com todos, em especial com os emigrantes que daqui partiram para um dia voltarem às origens.


Editado por Fernando Martins | Domingo, 11 Novembro , 2007, 12:21

ORAÇÃO


O Outono é Primavera
Frutificada. E o sentimento
Do amor,
Cristalizando,
Tornou-se incandescente.
É o coração aceso
De Cristo,
O novo Sol.

Teixeira de Pascoaes


In “Últimos Versos”

Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 08 Novembro , 2007, 23:50

Cada arbusto, por mais simples e modesto que seja (se é que há arbustos simples e modestos), é um mundo de cores variadas e de formas incrivelmente belas. Como este arbusto do meu quintal, visto em dia claro, como foi o de hoje. Vejam a variedade de tonalidades, de formas, de espaços esparsos por onde se escoa a luz, como que à procura de gente.

Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 01 Novembro , 2007, 09:11

OUTONO

Recolhe-se a morrer a Natureza.
O ar é fruto e mosto. Nos pomares
O moribundo Outono põe a mesa
E despeja o seu sangue nos lagares.

A Natureza expira; e, na tristeza
Da lenta morte que lhe vem dos ares,
Morre em paz, finda em sonho e em certeza,
Depois de abastecer todos os lares.

Anda na vida a lentidão do sono.
Maternalmente, as árvores, fraquíssimas,
Mal sustentam o fruto. O Inverno vem…

Assim expira o renascente Outono,
Em tardes que são mortes sereníssimas
De dias bons e que viveram bem…

Afonso Lopes Vieira

Editado por Fernando Martins | Quarta-feira, 31 Outubro , 2007, 10:52


UM PÔR DO SOL EM PANGALA


Um pôr do sol em Pangala, na fronteira norte de Angola, a uns 50 quilólmetros. para nascente de São Salvados do Congo (hoje M'Banza Comgo), que já foi a Capital do Reino do Congo, actual Zaire Angolano, Congo ex-belga, Congo ex-francês e outros povos congos a que agora mudaram o nome.
NOTA: Foto e informação do leitor e amigo Ângelo Ribau

Editado por Fernando Martins | Terça-feira, 30 Outubro , 2007, 16:38

Pérsia
Mo’Ezzi (c. 1048-1147)


OUTONO

O outono montou a sua tenda branca sobre os montes;
tiraram-lhe o tapete verdejante.
O ramo do jasmim perdeu os seus adornos
e a rósea olaia deixa cair as suas flores.
O pálido marmelo amarelece; a romã cora;
ó surpresa! terá um deles bebido o sangue do outro?
Os jardins estão assombrados por negros saltadores:
os negros corvos, com as suas vestes manchadas de pez.
Esses bailarinos do outono começaram a agitar-se;
as aves da primavera calaram os seus brandos concertos.
Amáveis servidores, para festejar o equinócio,
trazem os seus presentes ao afortunado príncipe.
E o longínquo mar encarregou a nuvem
de lhe lançar no trono, de presente, algumas pérolas.

Tradução de Maria Jorge Vilar de Figueiredo,

In “A Rosa do Mundo”

Editado por Fernando Martins | Sábado, 20 Outubro , 2007, 12:10

O PÔR DO SOL É PARA NOS ELEVAR
Há anos recebi uma lição que jamais esquecerei. Viajava com um amigo, com o crespúsculo do fim de tarde a aproximar-se a passos largos. De repente, ao virar de uma esquina, eis um pôr do Sol deslumbrante. O meu amigo parou o carro, de repente, e convidou-me a sair. E disse: esta beleza é para ser apreciada com serenidade; isto eleva-nos. E ali ficámos a contemplar, numa tarde de Outono, a riqueza multivariada do colorido de um Sol coado pelas nuvens que iam emprestando tonalidades quase inexplicáveis ao astro rei que mudava de hemisfério.
O meu amigo e leitor Ângelo Ribau tem destas sensibilidades. Esta foto, que lhe agradeço, foi tirada junto ao navio-museu Santo André. Aqui a partilhamos com os leitores do meu blogue.

Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 18 Outubro , 2007, 12:12
Foto de Ângelo Ribau
::
Alegria! Alegria!
Ó céu do meu País,
Onde as nuvens até são quase luminosas,
Ó Sol de Maio a rir nos canteiros de rosas,
Ó Sol Alegre, ó Sol Brilhante, ó Sol Feliz
Para quem o Inverno é um momento apenas.
Sol de ingénuas manhãs e de tardes serenas,
Ó Sol quente de Julho, ó Sol das romarias,
Queimando e endoidecendo as multidões sadias,
Sol candente do Algarve, ó Sol doce do Minho,
Florindo amendoais ou a espumar no vinho.
Sol das searas de oiro e dos vergéis de Outono
Palpitantes de cor como um largo poente;
Sol que ao dormir a terra o seu fecundo sono,
Lhe dás sonhos de luz, voluptuosamente.
Sol das eiras do milho e da roupa a corar,
Sol dos verdes pinhais e das praias trigueiras,
Ó Sol moreno e forte a resplender no mar
Tisnando as carnações mais as velas ligeiras
Ó Sol moreno, ó Sol alegre, ó Sol feliz
Sendo ainda clarão na hora da agonia.

- Canta a glória da Luz, canta a glória do dia
Em todo o meu País!

João de Barros

In Vértice, revista de cultura e arte, Junho de 1952

Editado por Fernando Martins | Domingo, 14 Outubro , 2007, 12:30


EPÍLOGO

Não receio fantasmas nem duendes
Na jornada que vai quase a findar…
Hoje como ontem, meu Desejo, acendes
O mesmo facho para me guiar.

Ontem como hoje, uma lição aprendes
Na luz do Sol, na longa voz do mar:
- Que, se é grande a saudade a que te prendes,
Maior é sempre a glória de esperar…

Toda a noite amamenta a manhã nova…
E o mar, onda após onda, já renova
Sem apelo de longe em seu clamor.

Eternidade desta vida breve!
- Nunca morre a ansiedade que te leve
A criar, dia a dia, a paz e o amor…

João Barros

In VÉRTICE, revista de cultura e arte, Junho de 1952

Editado por Fernando Martins | Quarta-feira, 10 Outubro , 2007, 10:04
Mata da Gafanha

Como gafanhão que me prezo de ser, ontem fui à Mata da Gafanha, para respirar o ar puro que os pinheiros e alguns arbustos nos oferecem, neste Outono. O Outono não é só folhas castanhas de várias tonalidades. O verde persiste para nos purificar o ar de que precisamos. E a Mata, extensa, não tem apenas pinheiros, mas também por lá há instituições que nos podem ajudar na recuperação das nossas vitalidades emocionais ou outras. Por isso, aqui fica esta sugestão, em dia que vai ser quente, como rezam as previsões meteorológicas.

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