PELO QUINTAL ALÉM – 5 Ti Sarabando com Ti Mar'Joana
O PASTO
A
Ti Sarabando
e a sua Mar'Joana ( Maria Joana)
Caríssima/o:
Hesitei no título: erva... pasto...
Vendo bem as coisas, optei por “pasto”; “erva” nos dias que vão passando até nos dicionários se lhe junta outra conotação muito afastada daquela que nos levava junto dos animais para os alimentar...
Os tempos são outros e não apenas o sentido das palavras se alterou...
a. Pelo nosso quintal há muita erva mas não da que se criava com a sementeira e a adubação abundante para se cortar e levar para os currais das vacas, dos coelhos, dos porcos. Agora não se criam animais e a erva nasce sem ser semeada!
e. Também pelas muitas terras da nossa Gafanha que é da erva que se semeava depois da apanha do milho? Não se vê...
Naqueles tempos, as terras eram limpas de felgas e melhãs; logo “adubadas” com esterco dos currais. Depois deste espalhado, lançavam-se à terra as sementes de cevada, centeio ou aveia. A seguir, margeava-se o terreno.
Parte destas sementeiras destinavam-se a dar grão, mas a grande maioria serviria de alimento para o gado na invernia.
Era ver então como, foicinha na mão, ah!, corta que corta, se enchia a carroça ou ajeitava o molho que se levaria à cabeça ou aos ombros.
i. Quando a economia de subsistência era rainha, tudo se aproveitava. Destas plantas, os do nosso tempo se lembrarão, as folhas e os caules verdes iam alimentar o gado. Das searas, as paveias eram levadas para a eira, malhadas, ensacava-se o grão; a palha ia para os colchões, para a cama dos animais e, por vezes, para a manjedoura.
o. Directamente para a saúde, nada consta; convenhamos, porém, que muitos considerandos positivos se poderiam acrescentar sobre o equilíbrio fisiológico e emocional ...
u. E aqui se agiganta a figura do Ti Sarabando.
Para nós, uma lenda da nossa Terra; para muitos, um desconhecido.
Toda a vida se dedicou à lavoura das suas terras com a preciosa colaboração da Mar'Joana.
Homem forte, para o baixo, lá vinha com o seu molho de erva à cabeça e por acaso encontrava sempre a quem dar dois dedos de conversa. Bem, dois dedos...
“Parente e amigo, o homem achar-se-á enganado!...”
O sino toca a chamar para a Missa e os devotos e as devotas começam a passar rumo à Igreja.
“Parente e amigo... Quando Jonas...”
Como o monólogo vai longo, ao pressentir menos atenção da outra parte, dá-lhe uma sacudidela com a mão livre e prossegue:
“Parente e amigo, o homem achar-se-á enganado!...”
Às tentativas para pôr ponto final e partir para outra, surgia sempre com renovado ânimo:
“Parente e amigo...”
Vão passando as pessoas que regressam da Missa... Apesar do cansaço de quem o escutava, creio que ainda hoje o podíamos contemplar com o molho de erva à cabeça e com igual vivacidade e entusiasmo virar-se e, desfiando a sua Bíblia, sorrir profeticamente, levantar o dedo e falar como quem vive e acredita no que diz:
“Parente e amigo: o homem achar-se-á enganado!...”
Porque de gado e de erva se trata, respiguemos um soneto de raiz bíblica que renova um desafio de Camões:
RaquelSete anos de pastor Jacob serviaLabão, pai de Raquel, serrana bela;Mas não servia ao pai, servia a ela,E a ela só por prémio pretendia.Os dias, na esperança de um só dia,Passava, contentando-se com vê-la;Porém o pai, usando de cautela,Em lugar de Raquel lhe dava Lia.Vendo o triste pastor que com enganosLhe fora assi negada a sua pastora,Como se a não tivera merecida;Começa de servir outros sete anos,Dizendo: – Mais servira, se não foraPara tão longo amor tão curta a vida!E terminemos voltados para os mais novos (se é que há algum perdido por aí...):
«Quem em novo não trabalha, em velho come palha.»
Manuel