Sempre divididos é o grande dilema de todos os emigrantes
O Nelson emigrou em Outubro de 1969 e eu em Marco de 1973, muito contra a minha vontade, porque não queria deixar para trás a minha querida avozinha. O Nelson emigrou forçado pelo denominador comum a tantos outros: em Portugal não havia futuro para as novas gerações. E também pelo facto de se ouvirem histórias lá de longe, que soavam melhor que o quotidiano que sentíamos em Portugal.
O Nelson nunca tinha tido ideias de emigrar, pois no momento trabalhava na Metalurgia Casal, uma companhia bem acreditada na altura, mas de um dia para o outro a decisão foi tomada e partiu mesmo...
Foi ter com uma irmã que ao tempo vivia em Newark, o que no fundo talvez tivesse sido a razão desta decisão repentina. A estada do Nelson não foi longa nos EUA devido a estar em trânsito para o Canadá, para onde seguiu e onde permaneceu dois anos. Depois voltou a Newark onde fixou residência, já como emigrante legal. Pouco tempo depois, em Fevereiro de1973, resolvemos casar e começar a nossa vida, a dois, nesse país distante mas muito acolhedor, que hoje consideramos a nossa segunda Pátria.
A língua, no início, foi a maior barreira que encontrámos, mas com boa vontade e persistência tudo se ultrapassou. Basta querer, pois os estabelecimentos de ensino abundam por todo o lado, e nós, graças a Deus, também, já não sendo jovenzinhos, conseguimos frequentar a universidade por algum tempo, eu de dia e o Nelson à noite. Isto foi algo que nos marcou e nos deixou recordações inesquecíveis
Um outro grande obstáculo foram as saudades, pois estávamos longe daquilo que nos fez, nos é querido e nos faz sentir seguros. Mas, a pouco e pouco, com a ajuda de novas amizades que vão surgindo e de novas experiências, a adaptação foi acontecendo. Graças, ainda, a certos grupos que, com o seu trabalho e boa vontade, nos vão oferecendo o que Portugal tem de melhor, que são as nossas tradições!
Da esquerda para a direita - sentados: Jessica, Nelson e Teresa; de pé: Peter e Ricky
Vale a pena mencionar o grande acontecimento do ano, 10 de Junho, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, onde todos os portugueses de vários cantos da América se encontram pelas ruas da Ferry St.
No meio da animação, trocam-se sempre aqueles abraços, como que a matar saudades da nossa terra e das nossas gentes. Que orgulho em ser português!
Infelizmente, a nova geração, com as crises que se têm feito sentir por todo o mundo, está um pouco arrefecida, mas a área da gastronomia, essa não, porque continua em força e em cada canto, a nossa bandeira, desfraldada ao vento, convida a entrar e a desfrutar a nossa comidinha portuguesa.
A família entretanto, foi aumentando. Temos três filhos, dois rapazes e uma menina, já adultos. O nosso mais velho, o Ricky, é advogado em S. Francisco, Califórnia; o Peter é economista e a Jessica, ainda estudante, residem no Estado de New Jersey. Há cerca de quase três anos, um rebentinho, o Madison, fruto do casamento do nosso filho Peter com a Christine, uma moça americana, veio enriquecer ainda mais as nossas vidas.
Nos EUA sentimo-nos muito portugueses e participamos em bastantes eventos da comunidade portuguesa. Vivemos três anos no "Ironbound", nome dado ao lugar onde os portugueses vivem em Newark, e depois comprámos casa no meio americano, onde nos últimos quase trinta anos da nossa estada nos EU vivemos, participando activamente na paróquia de St. Mary's em Colts Neck, NJ, paróquia esta que é um exemplo para qualquer comunidade, devido aos programas educacionais e morais que aí se praticam e que têm feito a diferença na vida de muitas famílias.
Há cerca de sete anos tomámos a decisão de voltar definitivamente às nossas raízes, a nossa querida Gafanha, um sonho tornado realidade, mas que acarreta por vezes muita tristeza, muita saudade, muita nostalgia, porque já não viemos inteiros. Parte de nós ficou na família que constituímos, nos lugares onde vivemos e nos amigos que fizemos, ao longo dos anos. Sempre divididos é o grande dilema de todos os emigrantes, e nós não somos excepção!
Teresa e Nelson
Nota: Texto elaborado a partir de uma entrevista, via Internet, com a Teresa e o Nelson Calção, gafanhões, com muitos anos a mostrarem uma grande alegria de viver.
Fernando Martins