de Fernando Martins
Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 10 Dezembro , 2009, 21:38


Exemplo de vida para toda a gente

O realizador de cinema Manoel de Oliveira completa hoje, 11 de Dezembro, a bonita idade de 101 anos. É, como todos os portugueses devem saber, o mais velho realizar em plena actividade, sendo para toda a gente um exemplo de amor ao trabalho e à vida.
Independentemente de se gostar ou não dos seus filmes, a verdade é que ficará na história da sétima arte, em Portugal e até no mundo, como modelo do amor à arte e à cultura, não dando tréguas nem cedendo à vontade de se manter na ribalta. Quando muitos buscam a reforma ou a aposentação para parar na vida, dedicando-se a nada fazer de útil para a sociedade, é bom que se recorde e se apresente este cidadão que se recusa a parar. Não é verdade que parar é morrer?

Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 10 Dezembro , 2009, 18:49

O novo elogio da loucura?

1. Decorria o início do século XVI e a sociedade europeia vivia sobressaltos de nunca vista desumanidade. A exploração escrava de outros povos descobertos, o egoísmo da riqueza e as cruéis guerras religiosas no coração da Europa registaram nos anais da história das piores páginas de sempre. Neste duro ambiente, alguns grandes autores procuraram interpretar o seu tempo propondo caminhos a seguir de forma humana e digna. Algumas dessas grandes personalidades inscreveram-se no chamado pensamento da renascença, o qual proporcionou uma recriação actualizada das ideias e artes clássicas. Se o problema da sociedade da época era humano, estes autores apostaram na resolução da “questão antropológica” (ou seja, do repensar o agir humano).


2. Erasmo de Roterdão (1466-1536), essencial personalidade da renascença, escreve no ano de 1509 e publica em 1511, o famoso ensaio O Elogio da Loucura. Trata-se de uma obra, segundo especialistas, das mais influentes da civilização ocidental, sendo um dos catalisadores da designada Reforma Protestante. O Elogio da Loucura, em que a loucura é comparada a uma deusa, espelha os cenários de uma época controversa, através da sátira, do sombrio, da prática supersticiosa, da corrupção, da indignidade, do crime horrendo, num cortejo de miserabilidade sem limites. Tratava-se, fundamentalmente, do elogio de acontecimentos, posturas e coisas sem qualquer valor. Uma contradição, espelho de total vazio.

3. A que propósito vem esta temática? Há semanas quando dos rasgados elogios do presidente do Irão ao presidente da Venezuela, e deste ao presidente do Irão, lembrámo-nos do povo desses países e da estranha razão para tanto “elogio”. Decorria, então, a visita com “glamour” do presidente iraniano pela América latina, na procura jubilosa de angariar parceiros para a sua causa… Diz-se que a “questão antropológica” (sobre quem é o ser humano?) está na ordem do dia… Não há razões para tanto elogio, porquanto o estado do povo é que deve falar pelo líder…!

Alexandre Cruz

Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 10 Dezembro , 2009, 12:22


"O meu pai tinha quatro irmãs mais novas e um irmão que morreu pequenino, de meningite, por volta da idade em que tive essa doença. Parece que comecei com muita febre e horas depois estava em coma. Inexplicavelmente sobrevivi. Há de certeza pessoas que, pelo que vou dizer, me acharão tonto, mas ninguém me tira da cabeça que Santo António me salvou. E lá me levaram, aos sete anos, a Pádua, tocar no túmulo do Santo e fazer a primeira comunhão. A minha relação com Deus tem sido sempre tumultuosa, cheia de desacordos e discussões: longos períodos em que me afasto, alturas em que me aproximo, amuos, quase insultos, discussões. Creio firmemente que, nos livros que escrevo, é Ele que guia a minha mão e não passo de um instrumento da Sua vontade. Quantas vezes me vem à cabeça aquele pequenino poema de Sebastião da Gama: a corda tensa que eu sou o Senhor Deus é quem a faz vibrar; ai linda longa melodia imensa: por mim os dedos passa Deus e então já sou apenas som e ninguém se lembra mais da corda tensa. É que não escrevo assim tão bem, trabalho sem plano e quase me limito a assistir ao que vai ficando no papel. O meu único mérito é fuçar o dia todo, até ser apenas som. Componho-os numa espécie de febre, no fundo de um abismo em que me perco, cego e surdo, não resultam nunca de uma deliberação mental, um propósito, um plano definido. Não concordo com Jean Daniel, quando afirma que a única desculpa de Deus é não existir: há alturas em que o sinto tão fortemente em mim, alturas em que o sei tão longe.
O cancro, por exemplo: o Henrique, que é um homem de Fé, diz que me salvei porque nasci com um sistema imunitário fenomenal. Palavras dele. No meu modesto entender esse sistema imunitário fenomenal tem um nome, e esse nome entendeu que eu ainda era necessário aqui. Para escrever, julgo, porque fora dos livros nada valho: os meus defeitos e as minhas imperfeições são enormes. Tão inteligente para umas coisas e tão estúpido para outras, espantava-se a minha mãe. Aborrece-me admitir que é uma excelente definição do António. Nunca fui uma criatura estruturalmente má: na verdade não passo de um aselha, um parvo, incapaz de lidar com as coisas mais simples do quotidiano, um imbecil desamparado. Se os meus amigos não tomassem conta de mim com tanto desvelo não estava aqui a escrever isto, pedia esmolas nos semáforos. Regressando ao princípio o meu pai teve um irmão que morreu pequenino, de meningite. Contou-me certa vez uma coisa que não esqueci nunca: era criança e tinha ido com o pai buscar os exames do irmão. Meningite tuberculosa, sentença de morte. Vieram para casa com o meu avô a guiar o automóvel, e o meu pai, sentado ao lado do meu avô, via as lágrimas descerem pela cara impassível. Todos os dias, na esperança do filho se salvar, a minha avó ia a pé das portas de Benfica à capelinha da Senhora da Saúde, o que nessa época, e com o estado das ruas de Lisboa, exigia um esforço enorme. Depois dos meus avós morrerem as minhas tias encontraram toda a roupa do irmão guardada num armário: não foram capazes de se desfazer dela, não quiseram desfazer-se dela. Já nenhuma das pessoas de que falei se encontra neste mundo: os meus avós, o meu pai, as minhas tias. Sobro eu e, em certo sentido, enquanto cá estiver eles continuam. Para quem pensam que escreve o imbecil desamparado? Para as lágrimas de um homem pela agonia do filho, para uma mulher a caminhar diariamente quilómetros na esperança de que Deus o curasse. No jazigo dos meus avós lê-se


Ao nosso Antoninho

e, de vez quando, vou lá às escondidas. Podem pensar na minha cretinice, não me rala, sinto-me bem junto deles. Os meus livros são isso: as lágrimas daquele homem, os passos daquela mulher. No caso de se aproximarem mais das páginas é o que realmente verão, em lugar de palavras impressas. E talvez vejam também o cretino a espreitar, comovido, pelas grades da porta."

António Lobo Antunes

In Visão, 01.10.2009


Nota: Crónica recordada pela Pastoral da Cultura

Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 10 Dezembro , 2009, 12:00


Entronização dos 24 confrades fundadores

Integrado nas Comemorações dos 250 anos da Cidade de Aveiro, irá decorrer no próximo dia 12 de Dezembro, pelas 13 horas, o 1.º Capítulo da Associação Cultural Confraria dos Ovos Moles de Aveiro. A cerimónia capitular, que decorrerá no salão nobre do Hotel Imperial (Aveiro), contará com a presença de diversas Confrarias Gastronómicas e Báquicas Nacionais, assim como com a Presidência da Federação Portuguesa das Confrarias Gastronómicas, a par das forças vivas da cidade, do poder local ao turismo, e outras entidades culturais e eclesiásticas.
Serão entronizados, no decorrer da celebração, os 24 Confrades Fundadores, assim como demais Efectivos e de Honra, quer individuais quer institucionais.
A mais recente confraria gastronómica do país, idealizada numa conversa entre amigos em Dezembro de 2008, a Confraria dos Ovos Moles de Aveiro rapidamente ganhou importantes adeptos, ideias e força, culminando num ano intenso e de múltiplos desafios, com vista à promoção dos deliciosos doces conventuais com desenhos marítimos, ex-líbris inesquecível da cidade. Tais doces, requintado artesanato representativo de Aveiro, viriam a ver o reconhecimento europeu em Abril último, com a Comissão Europeia a incluí-los na lista de produtos alimentares, com a denominação de "Indicação Geográfica Protegida", primeiro doce português a receber tal atribuição.
Receita original, concebida inicialmente pelas carmelitas da cidade, no séc. XIX, confeccionados somente com gema de ovo, açúcar e água, o seu segredo tem sido mantido ao longo de várias gerações.
A Confraria dos Ovos Moles de Aveiro assume assim uma missão de grande responsabilidade na promoção deste famoso doce tradicional, aquém e além fronteiras, o que se traduzirá inevitavelmente pela promoção da Região de Aveiro.


Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 10 Dezembro , 2009, 11:45

NATAL

Menino Jesus feliz
Que não cresceste
Nestes oitenta anos!
Que não tiveste
Os desenganos
Que eu tive
De ser homem,
E continuas criança
Nos meus versos
De saudade
Do presépio
Em que também nasci,
E onde me vejo sempre igual a ti.

Miguel Torga
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Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 10 Dezembro , 2009, 01:22


Biblioteca Municipal de Ílhavo

A Câmara Municipal de Ílhavo vai entregar, hoje, dia 10, pelas 10.30 horas, na Sala Polivalente da Biblioteca Municipal, as Bandeiras Verdes aos Estabelecimentos de Ensino, premiando, desta formar, o excelente trabalho desenvolvido pelas Escolas nas áreas ambientais. Refira-se que este empenho de professores,  funcionários e alunos contribuiu para que o Município de Ílhavo passasse a ser o 2.º Melhor Município do País, no âmbito da dinamização do  projecto das Bandeiras Verdes, com 30 Escolas galardoadas, em 2008 / 2009.
Esta cerimónia mais significado tem, por neste dia se comemorar a Declaração Universal dos Direitos Humanos, ao mesmo tempo que decorre a Cimeira sobre o Clima, em Copenhaga.



Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 10 Dezembro , 2009, 00:32



Chicotadas do Papa e seu sentido verdadeiro

O taxista que, pelas ruas do Porto, me levava à estação de Campanhã, percebendo pela conversa dos que me acompanhavam que eu era homem da Igreja, lamentou-se da notícia publicada no jornal desse dia, que dizia que o Papa João Paulo II, segundo o testemunho de uma freira polaca, se chicoteava a si próprio, no seu quarto privado e na calada da noite. E comentava: “O senhor já morreu há tanto tempo, porque vêm agora os jornais com esta conversa. Ele fazia o que entendia, e ninguém tem nada com isso”. Pôs-me nas mãos o jornal do dia onde vinha o que se dizia do Papa. Lá lhe expliquei o que significavam essas chicotadas e que o que dissera a religiosa fora para justificar a santidade e a virtude de João Paulo II.
Compreende-se que, num tempo em que se idolatra o corpo, se fique chocado ao saber que alguém, ainda por cima o Papa, o chicoteava de quando em quando.
Cilícios, disciplinas, jejuns eram formas ocasionais de penitência pessoal, frequentes em tempos passados, não muito longínquos, e, ainda hoje, ao alcance de quem livremente as quiser usar. Consideram-se meios de ascese cristã, porque de apelo à purificação e ao fortalecimento interior. Destes permanece ainda, na Igreja, como conselho de livre acolhimento e preceito duas vezes por ano, o jejum, como apelo à partilha com os pobres. Na sociedade, ele pratica-se, por vezes com exageros prejudiciais à saúde, por razões estéticas. As disciplinas e os cilícios foram progressivamente esquecidos, como se se tratasse de instrumentos desumanos, capazes de envergonhar gente evoluída.
Pelos vistos, João Paulo II, não pensava assim. Eu também não o penso. Durante um retiro espiritual de 30 dias, que fiz em Espanha, já lá vão mais de quarenta anos, usei algumas vezes, poucas, a disciplina, ou seja, chicoteei-me, a conselho do orientador, um padre jesuíta, homem de virtude, que tem introduzido o seu processo de canonização. No início dos cursos de cristandade, década de sessenta, também usei algumas vezes o cilício, a exemplo dos dirigentes responsáveis, vindos de Ciudad Real, para nos ajudarem, na minha diocese de então, no lançamento desse método evangelizador. Em nenhum dos casos senti que este uso ocasional me tivesse feito mal, me entorpecesse o sentido, me tirasse a alegria, me traumatizasse para a vida. Na corrente do tempo que se vive, não voltei a usar nem a disciplina, nem o cilício. Mas guardo-os para poder mostrar a quem nunca experimentou, nem viu, aproveitando para fazer a catequese da necessidade que todos temos de nos penitenciarmos, seja lá como for, como recomenda a Palavra de Deus e o ilustra a vida de muitos santos.
A vida mostra que só consegue perceber o valor e a alegria da humildade, que traduz a verdade que somos, quem voluntariamente se humilha ou aceita, com coragem, a humilhação que lhe sobrevém. Cilício e disciplina eram caminho para conter orgulhos e vaidades, e não deixar que os êxitos nos desvirtuassem. Hoje há outros caminhos, que só o são, quando andados e praticados. Paulo fala destes e do uso pessoal que deles fazia, Cristo deixou a advertência que, sem penitência, todos perecem do mesmo modo.
A instalação cómoda entorpece os ossos, não os revigora. Paralisa, não agiliza.
A vida, assumida como dom e compromisso, é sempre penitência libertadora, para um coração que a fé orienta e a razão esclarece. A vida é, também, oração e louvor, para aqueles que não se esquecem que, ante Deus, são sempre todos mendigos agradecidos.
Fiquei contente e grato a João Paulo II, ao saber que ele, homem fascinante do nosso tempo, crente que dava a cara às adversidades, apóstolo que rompia fronteiras a proclamar Jesus Cristo, como único Redentor do homem, de quando em quando, se chicoteava a si próprio com a disciplina. Para Teresa de Calcutá, o caminho foi o da serena aceitação da privação de consolações, humanas e divinas, numa vida longa doada aos outros e a quem só bastou a certeza do dever cumprido e do amor nunca regateado.

António Marcelino
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