de Fernando Martins
Editado por Fernando Martins | Quarta-feira, 24 Dezembro , 2008, 13:23

Deste meu recanto, desejo a toda a gente um SANTO NATAL. Que a ternura do MENINO nos ajude a descobrir caminhos de paz, de fraternidade e de amor.

Fernando Martins

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Editado por Fernando Martins | Quarta-feira, 24 Dezembro , 2008, 12:41

Deambulo, por uma artéria movimentada, desta Veneza Portuguesa. O tropel dos transeuntes, que, aos magotes, percorrem a avenida, deixa transparecer a ansiedade e o nervosismo que os dominam. Está a aproximar-se o Natal e há que ultimar as compras da época. Aquilo que ainda falta para a, b, ou c. Sim, que o Natal vive das compras, dos desejos, mais ou menos sentidos, de Boas Festas, da troca de prendas, no dia de ceia. O Natal sem prendas não é Natal! Sem consumismo, também não! Fica a gratidão dos comerciantes, que, por estas alturas, engordam, significativamente, as suas receitas. A correria é tanta, que quase se atropelam, como figurantes de um presépio virtual. As ornamentações de Natal, que proliferam por toda a parte: árvores iluminadas da avenida e outras artérias, fachadas dos prédios, e os arcos nas ruas, evocam, nas pessoas, a lembrança de outros natais. Em mim, trazem a nostalgia duma harmonia perdida, o sentir que não é só o consumismo, nem a ornamentação garrida do meio circundante, que nos faz vivenciar o espírito natalício. Natal já se comemora há muitos séculos, desde o nascimento do Menino Jesus, em que as pessoas se agregam e congregam para festejar esse evento.
Nos meios rurais, há muitos anos atrás, a comemoração era feita, de modo diverso. As crianças da casa, montavam na “sala do Senhor”, dirigido para a janela, a verdadeira representação do Natal – o presépio. Com a industrialização da sociedade e a e(in)volução dos costumes, esta instituição foi-se perdendo e está, hoje, em agonia. Mas no ambiente rural, a tradição era religiosamente cumprida. A criançada afadigava-se, para produzir o melhor presépio. Iam buscar musgo, à mata nacional, já que ainda não existiam os pinhais particulares. O chão era um tapete de “alcatifa” verde, antecipação da coqueluche das alcatifas. Na fase seguinte, escolhiam criteriosamente as figuras de barro, representativas das personagens religiosas apreendidas na catequese. Os presépios dessa altura eram dignos de um concurso, em que a selecção seria difícil. A imaginação, a criatividade, o espírito laborioso eram dignos de registo. Além do fervor natalício, era uma boa forma de as crianças desses meios rurais, sem acesso nem possibilidade de adquirir as modernices de hoje, darem largas à sua fantasia e espírito criativo.
Hoje, com a evolução dos tempos, essas genuínas manifestações de Natal, foram substituídas por ornamentações de toda a espécie, com fitinhas, velas, plissados, luzes multicores e tudo o que a imaginação e a estética podem conceber. É esfuziante e apelativo para crianças e adultos, que sucumbem à intensidade deste jogo persuasivo. Nos dias de hoje, nos subúrbios das grandes cidades, parece que todos sofrem de falta de imaginação. Repetem com perfeição, aquilo que se passa nas grandes urbes. Mas, para que não sejam apelidados de puros imitadores, acrescentaram a essa panóplia de ornamentações, uma figura bizarra, vestida de vermelho e branco. Colocaram-na num sítio bem visível da casa, normalmente na fachada principal, empoleirada em escada tosca, numa posição de alpinista falhado. Será, seu propósito, subir ao telhado e descer pela chaminé para deixar as prendas aos miúdos e graúdos? Mas, vejo-o sempre numa posição estática, não arreda pé! Chegará à chaminé, no dia de S. Nunca à tarde? Desejo-lhe boa viagem e que vá estugando o passo!
Tentará isto ser um arremedo da fantasia que a tradição cristã criou acerca da existência das prendas? Recordo, ainda, com saudade, os natais da minha meninice; na véspera de Natal, a pequenada era solicitada a colocar os seus sapatinhos, no borralho (=lareira), por baixo da chaminé. Depois de uma noite de sono, sobressaltada, a imaginar a surpresa que os esperava, logo de manhãzinha, muito cedo, acorriam à cozinha para fazerem como S. Tomé: ver para crer. Ouviam-se risos de alegria e crianças aos pulos de contentes, extravasando tudo o que lhes ia na sua alma pura, de seres angelicais.
Tenho bem viva na memória, a cena ocorrida comigo num dia de Natal de há mais de meio século. Ainda ensonada, dirijo-me à cozinha onde encontro o meu pai, que me diz com a voz mais inocente deste mundo: M....D. vai buscar as prendas que o menino Jesus te deixou no sapatinho! Fui acometida do maior espanto do mundo, ao confirmar que aquele pequenino ser, rechonchudo e diáfano, me incluíra na sua lista de entregas ao domicílio! Invadiu-me uma admiração, um espanto, uma gratidão, uma veneração, cujos efeitos, ainda hoje perduram, (no meu relacionamento com as pessoas). Era assim, a entrega de prendas, com beleza e singeleza, às crianças inocentes e puras.
Hoje tudo está mudado; as crianças de hoje, habituadas às Playstations, aos gameboys, aos computadores, às pens, etc, desconhecem por completo a existência de outros costumes do passado. Se calhar, o Menino Jesus ainda não se rendeu à invasão das novas tecnologias, vulgo T.I.Cs. Provavelmente, estará a precisar de umas aulitas de Informática, para se actualizar e informatizar o serviço de recepção no Céu. Temos cá na terra, nomeadamente, numa Escola, bem conceituada, no ranking, pessoal altamente competente nesse domínio, uns verdadeiros experts! Só é pena essa escola simpática ficar num lugar recôndito do Planeta Terra: a Gafanha da Encarnação: talvez haja aliciantes para convencer o Menino a vir cá: a proximidade da ria, como local aprazível; a existência de ovos-moles, na Veneza Portuguesa, a curta distância desta vila, à beira ria plantada, aquelas deliciosas sandes de leitão, provenientes duma cidade tão visitada por forasteiros, a Mealhada, que matam a fome, aos professores famintos; é vê-los a digladiar-se para conseguir a maior (!!!).
Assim, quando lá entrar alguém, no Paraíso, as formalidades de ingresso, o check in,, serão altamente facilitadas. E quando houver filas, será que há candidatos ao céu, neste inferno de vida em que vivemos? Andamos todos com tanto asco (pecado!) à ministra! A burocracia seria significativamente encurtada. Vêem as grandes vantagens da Informática? E eu que demorei tanto tempo a render-me a essa evidência. Agora, não a dispenso!
Tudo veio a propósito de o Menino Jesus, hoje em dia, não trazer prendas, que tenham a ver com esta revolução tecnológica.
O presépio, depois de um curto período de agonia, sucumbiu à mudança dos tempos. Em vez de observarmos, pela época do Natal aquelas maravilhas de arte popular, começamos a vislumbras a figura do Santa Claus, sentado, escarrapachadamente no seu trenó, puxado por resistentes renas. Esta imagem é motivo pictórico recorrente, nos cartões de Natal, que, infelizmente, também estão em vias de extinção. Até isso, que, de alguma forma, constituía um incentivo à escrita e à criação artística, quando eram manufacturados pelo remetente, está no seu estertor de morte. Todos esses salutares costumes se estão a perder, dando lugar a formas estereotipadas de mensagens natalícias. Nos dias de hoje, os computadores, mais precisamente a Internet, conquistaram o terreno e quase que detêm o monopólio da comunicação. Daí, a pertinência das siglas: W(ide) W(orld) W(eb).
Outra das representações natalícias, que se espalha por toda a parte, é a famosa árvore de Natal. Dentro e fora das casas, na rua e nos estabelecimentos comerciais, de maior ou menor porte, ela aí está, imponente e enfeitada de forma soberba. Sabemos, através dos media, que as várias capitais do mundo, se empenham para alcançar o primeiro lugar no ranking, com o objectivo de conseguirem entrar no Guinness; é esta a meta almejada!
Será que o espírito do Natal, apesar de todas as transformações que se deram na sociedade, de toda a evolução tecnológica, de todo o materialismo reinante, ainda consegue resistir, nesta luta desigual? Compete a cada um de nós, fazer com que prevaleça ou desapareça essa tão aconchegante vivência mística. do Natal.

Maria Donzília de Jesus de Almeida

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