de Fernando Martins
Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 20 Dezembro , 2007, 16:08
EU DORMIA PROFUNDAMENTE
E... SORRIA!
Poucos dias antes do natal de 1962 havia grande azáfama na nossa Companhia. Tínhamos recebido informações de que o IN iria aproveitar a época natalícia para meter grande quantidade de armas e munições no território angolano. A passagem seria pela já nossa conhecida picada do Quelo.
Ficámos admirados com tanta e concisa informação! Seria mesmo verdade? Ou isto seria mesmo contra-informação? Pelo sim pelo não ficou resolvido pelas altas esferas da Companhia que até ao dia 23 haveria sempre dois pelotões em movimento, fazendo emboscadas, patrulhando as picadas prováveis para a passagem do IN.
No dia 23 houve que ir ao abastecimento a São Salvador para a consoada! Que diabo de abastecimento seria esse? Batatas haveria, mas… e o bacalhau? E as couves?
Para mim uma boa feijoada com dobradinha brasileira era o suficiente! Para quê sonhar tão alto? Não querias mais nada: - bacalhau com couves! Estamos em Africa, dizia-me o Costa Pereira em ar de gozo.
O nosso pelotão estava de serviço ao acampamento e teve de ir à água e à lenha, pois dois estavam em operações e o outro tinha ido ao abastecimento.
Estava curioso por saber o que o nosso vagomestre nos iria trazer para a noite de consoada. Traria com certeza o que o “Barriga de Guinguba” tivesse trazido de Luanda. Abastecimento local não havia.
O pelotão chegou era já um pouco tarde e descarregou no armazém. Os pelotões operacionais também haviam regressado. Pessoal cansado. O que vale é que amanhã é dia de consoada e não haverá operações, pensava-se! Caminhava-se de vagar, ao deus-dará, pela parada. Um ou outro homem chegava-se à cantina para se dessedentar com uma 7UP ou uma Cuca fresca. Que pensariam aquelas almas? No dia seguinte era dia de consoada. Pensavam no mesmo que eu, com certeza.
Ao menos valia a pena. O que sucedeu em 1961 não se repetiu!
No dia seguinte, depois do almoço, o Zé Cozinheiro começou a tratar da ceia da consoada. O Furriel Cura, o vagomestre, convidou-nos a ir ver como corriam os serviços pela cozinha. Fomos. Era um modo de passar o tempo, de afastar as ideias que com a velocidade da luz teimavam em lembrar-nos o que se passava lá longe!
Ao chegar à cozinha notei um amontoado de grades de madeira. Ó Cura, o que é aquilo?
Não sei, vamos ver. E pegou num martelo de orelhas para abris uma grade. Olhei e vi com espanto a inscrição na madeira: “Cod-Fish”. Meu Deus, disse eu. Vamos ter bacalhau para a consoada! O Cura riu com satisfação e disse, vamos ver!
Desmantelou a grade de madeira que protegia outra embalagem hermética, feita de folha de zinco prateada, que dizia em inglês “Embalado na Africa do Sul” Não resisti e puxei a pega que servia para abrir a lata, deparando com seis bacalhaus do tamanho crescido lá dentro. Arranquei uma fêvera, meti-a à boca e, ao tomar-lhe o sabor exclamei:
- Malta, é mesmo bacalhau!
Alguns riram com a minha admiração. Só fiquei com pena de não ser bacalhau português, seco e embalado na minha terra. A embalagem seria de ráfia, mas o sabor seria melhor do que este.
Enfim, coisas que se pensam, para não pensar noutras coisas!
Arrumaram-se as camas de uma caserna e montaram-se mesas corridas. Nessa noite toda a companhia cearia junta, num sinal de união.
Cura, como conseguiste arranjar o bacalhau? Olha, não contava, mas às vezes “os tropa do ar condicionado”, lá fazem destas coisas, e ainda mais, mandaram couves. Estão todas murchas. Mas o Zé Cozinheiro há-de arranjar processo de elas ficarem apetitosas.
O dia ia passando, o sol ia-se escondendo lá para os lados de São Salvador do Congo!
Que será feito hoje dos meus dois irmãos que estão em Angola?
Um, Policia Militar, estará em Luanda, o outro está, salvo erro, em Tomboco, no coração dos Dembos.
Ambos solteiros, estarão a pensar na nossa família?
O que está em Tomboco estará como eu, tentando, – só tentando – pensar no que nos rodeia.
O que está em Luanda, em serviço ou fora dele, ao ver as montras e a alegria festiva dos passantes, deve ter muitos apertos do coração!
O tempo estava quente, a azáfama no acampamento era muita. O que me admirava eram os passeios isolados de muita gente pela parada. Não se conversava. Mãos nos bolsos, embora a temperatura que se fazia sentir ser elevada (estava-mos no Verão), olhando para o além, tentando descortinar o que se passaria ao longe.
Anoitecera. A noite estava escura. Fui fazer uma ronda, conversando com este e aquele, a minha pergunta era sempre a mesma: - Então pá, tudo bem?
E a resposta era sempre a mesma: Um encolher de ombros, e… tudo bem!
Também nas sentinelas se notava aquela ausência do espírito. O corpo estava ali, mas o espírito andava muito por longe. Era perigoso este estado de espírito para quem estava de serviço. Disse aos sentinelas que não queria ver ninguém sentado. De pé e a passear de um lado para o outro. Quando o pessoal que os haveria de render ceasse, viria rendê-los e eles iriam cear.
E assim se ia passando a noite de consoada, à espera da ceia.
Enfim, chegou a hora. O pessoal sentou-se. Ia começar a ceia. Tinha havido ordem de o gerador trabalhar mais duas horas, até à uma da madrugada!
À ordem de cear quase todas as bocas se calaram, executando outra função mais útil: comer. O bacalhau era bacalhau também no sabor, as couves embora com aspecto de verdes, tinham um sabor a nada!
Finda a refeição, foram rendidos os homens que estavam de serviço, e vieram eles cear.
Tinha terminado a ceia de consoada. Antes de nos sentarmos à mesa, iam-se fazendo os preparativos e pensando esperançados na ceia de Natal. Agora que esta terminou, sentíamos o estômago cheio, mas faltava qualquer coisa na cabeça!
Fui dar uma volta, fazer mais uma ronda, já que não havia mais nada a fazer. Era meia-noite. Tudo estava bem.
Ao passar no último posto, dois sentinelas conversavam e um dizia para o outro: A esta hora, na minha aldeia, repenica o sino da igreja a chamar os fiéis para a missa do galo.
Mais uma vez a minha mente voou à velocidade da luz, para longe!
Repreendi-os, não pela sua conversa, que me chocou pela lembrança que me trouxe, (não me atreveria a tanto), mas por estarem os dois fora dos seus postos de vigia…
Cheguei-me à nossa caserna, passei palavra ao sargento que me ia render, para me chamarem quando chegasse a minha hora de serviço, e estendi-me na cama. Adormeci. Só acordei quando já era dia. Levantei-me atrapalhado: - Que diabo, e a minha ronda?
Fui então informado pelo meu colega, que, quando ia para me acordar, eu dormia profundamente… e sorria!
- Não fui capaz de te acordar, e fiz a ronda em teu lugar, disse-me o Miranda!

Ângelo Ribau Teixeira
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Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 20 Dezembro , 2007, 15:31

O Museu de Serralves, no Porto, abriu as portas a todo o mudo virtual. Com um simples clique, fica ao nosso alcance tudo quanto a este museu diz respeito. Em http://www.serralves.pt/ podemos recriar uma visita e passar por todos os seus espaços museológicos e jardins, ficando, assim, com apetite para o conhecermos ao vivo. Cada visita, cada momento, cada recanto, enfim, tudo quanto ele tem para nos brindar ali está, gratuitamente, para nos dizer que merece ser apreciado e acarinhado por todos os amantes da arte. Hoje de manhã, nos noticiários radiofónicos, ouvi a nova da sua abertura ao mundo virtual. E já lá fui. Por isso aqui deixo o recado: passem por lá, que vale a pena.
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Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 20 Dezembro , 2007, 12:24


Primeiros estatutos aprovados
em 20 de Dezembro de 1957

Oficialmente, a Obra da Providência, instituição particular de solidariedade social, completa hoje meio século de vida. Foi fundada por duas vicentinas da Gafanha da Nazaré, Maria da Luz Rocha e Rosa Bela Vieira, antes dessa data, continuando, ainda hoje, a prestar à comunidade diversos serviços, tendo sempre em conta os mais pobres.
Neste dia de festa e de acção de graças, promovido pela direcção, a que se associam as fundadoras, aqui ofereço um excerto do livro em preparação, sobre a vida desta instituição, com sede na Gafanha da Nazaré:


Primeiros passos


A Conferência de Nossa Senhora da Nazaré, da Sociedade de S. Vicente de Paulo, foi criada na paróquia da Gafanha da Nazaré em 16 de Fevereiro de 1953, depois de um tempo de preparação, animado pelo prior Abílio Saraiva. Dela faziam parte, entre outras, Maria da Luz Rocha e Rosa Bela Vieira, que logo se envolveram no apoio aos mais carenciados de amor e de pão.
Nessa qualidade, as duas vicentinas ajudam naquele ano uma rapariga empregada numa taberna, que andava à procura de emprego. Havia sido despedida, por pressão de algumas mulheres de bacalhoeiros, junto do patrão, que receavam que os seus maridos perdessem a cabeça com ela. Este foi o primeiro passo que as havia de despertar para uma acção caritativa na paróquia e cuja meta estavam longe de sonhar. Sabiam, isso sim, que tinham de fazer alguma coisa de concreto por raparigas e mulheres como esta, que desejavam viver com dignidade, obviamente à margem da prostituição, uma escravatura de todos os tempos. Como é sobejamente conhecido, à época, qualquer simples mãe-solteira teria muitas dificuldades em se empregar.
Algum tempo depois, três jovens, de passagem pela freguesia e integradas numa “Barraca de Tiro” ambulante, sabem do apoio dado à rapariga já referida. Tomam a iniciativa então de aparecer em casa de Maria da Luz Rocha, de malas na mão, pedindo que as ajudassem a levar uma vida digna, longe dos ambientes em que se encontravam envolvidas.
Maria da Luz Rocha era uma viúva recente e tinha quatro filhos pequenos para sustentar e educar. Recebe-as a título provisório em sua casa, até que, com a sua colaboradora, possa decidir o que fazer, no sentido de as ajudarem a descobrir soluções respeitáveis para a sua sobrevivência.
As duas vicentinas não mais pararam: movimentam amizades e procuram arranjar-lhes empregos decentes e de acordo com as suas capacidades e necessidades. Muitas tentativas saem frustradas, dada a forte rejeição da sociedade às raparigas marcadas por ambientes menos próprios na zona, onde eram convidadas, depois dos horários de trabalho, a saírem à noite, o que elas não queriam. Sabiam, naturalmente, qual era a finalidade do convite.
O filme “Ao longo da rua”, que contava a história de mãe-solteira que havia sido rejeitada pelo namorado e pai do filho e pela comunidade, mais acicatou em Maria da Luz o desejo de lutar contra a sociedade injusta, apesar da grande maioria da população portuguesa se dizer católica.
Mais uma aparece, entretanto. A bola de neve começa a crescer e a movimentar-se, imprimindo muito ânimo a Maria da Luz Rocha e Rosa Bela Vieira.
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Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 20 Dezembro , 2007, 12:23



PUTIN, ANO 2007!


1. Na eleição simbólica de todos os anos, que vale o que vale mas que fica para a história, a revista Americana Time elegeu o presidente russo, Vladimir Putin, ficando à frente do Nobel da Paz ambiental, Al Gore, e da escritora das aventuras de Harry Potter, J. K. Rowling. Não se pense que, logo à partida, tal eleição represente o mérito das obras valorosas ao serviço da comunidade. Desde 1927 que a revista elege uma personalidade e nem sempre pelos melhores motivos; na lista “menor” dos eleitos estão, por exemplo, Hitler ou Estaline. Assim, o critério, mais que o mérito do bem realizado, sublinha a influência da acção sobre a comunidade, pois pela revista na eleição trata-se de "um reconhecimento do mundo como ele é e dos indivíduos e forças que determinam esse mundo – para melhor ou para pior".
2. Nos últimos tempos muito se tem falado da falta de liberdade de expressão na Rússia, da crise social que permanece, de situações de repressão e mesmo de liquidações pessoais dos denunciadores da autoridade exacerbada de Putin. O certo é que, mesmo no meio deste cenário, e essa é a causa da eleição, o presidente russo devolver o “poder” ao poder russo e, apesar de tudo, a estabilidade que os seus concidadãos pretendiam, recolocando a Rússia no mapa das grandes potências mundiais. Se dos comentários políticos americanos as palavras são poucas, também da Rússia um certo “silêncio” estratégico sobre esta eleição será a “satisfação” por recolocar no cenário internacional a Rússia como incontornável actor político (e económico).
3. E agora, o que se segue? A visão energética do gás muito colaborou para este recentramento russo. Politicamente, o “princípio da incerteza” será capitalizado por Putin e, na base desta autêntica rampa de lançamento, servirá a estratégia do poder de uma Rússia que tem sede de protagonismo. Por agora está acertada a táctica anunciada de Putin deixar o governo no próximo ano, mas indicou a perspectiva de se tornar primeiro-ministro se seu aliado mais próximo, Dmitry Medvedev, for eleito para sucedê-lo na Presidência russa. Vamos a ver!... A certeza é uma, a história da Rússia, dos Czares, daquele lado do mundo, simbolicamente, está de volta à cena mundial. Boa notícia? Depende. Putin ganhou agora argumentos de peso (autoridade) para “engordar” no poder com o que isso implica o puxar de todos os cordelinhos da auto-estima de um povo “decaído” nas últimas décadas. Pelo perfil da história russa, pode ser perigoso.
4. Uma certeza está garantida, nada será como dantes, pois a afirmação russa será isso mesmo, afirmação, crescimento, imposição, autoridade internacional. Em tudo há que contar com o contrapeso russo. Esperamos que sempre para o melhor!

Alexandre Cruz

Editado por Fernando Martins | Quinta-feira, 20 Dezembro , 2007, 11:29


Dois veados pobres juntam-se para sobreviver: um pede esmola e outro vende sucata. Tinham descoberto a amizade.
Certo dia, encontram outro veado pobre e solitário. Convidam-no a andar com eles. Haviam descoberto a fraternidade.
E assim fazem a outros veados perdidos que vagueiam nos caminhos da vida. São já um conjunto admirável com seus destacados adornos. Tinham descoberto a solidariedade.
Numa bela ocasião, celebram uma festa com os seus pobres meios. Haviam descoberto a alegria.
Juntos, fazem planos quase sempre utópicos. Tinham descoberto o sonho, o entusiasmo.
Vão aonde querem, sem horários nem chefes, desfrutam do sol e das estrelas quanto lhes apetece. Haviam descoberto a liberdade.
Dormem quase todos a céu aberto, alguns num curral e outros numa cerca sem portas.
Sentem cada vez menos a solidão e a companhia dá-lhes grande alegria, enche-os de satisfação. Tinham descoberto a felicidade.
Porquê – perguntam uns aos outros – não vamos oferecer à sociedade este “saco” de valores preciosos que conseguimos e tanto nos enriquece?! Parece que lhe falta algum ou mesmo todos. E cheios de generosidade põem-se a caminho e começam a fazer a sua oferta. Mas a sociedade ri-se deles, humilha-os com insultos, expulsa-os e marginaliza-os.
Eles, felizes, voltam ao seu ritmo de vida, a passar a noite nos locais habituais, nos bancos do parque, nos vãos das escadas.
Na manhã seguinte, dão conta de que a sociedade está arrasada e destroçada pelo egoísmo, a inveja, a avareza e o materialismo. A Bolsa de Valores económicos registava uma queda acentuada e a bolsa dos valores morais havia pedido asilo em qualquer limbo remoto.
Então a sociedade apressa-se a exigir aos veados os seus preciosos valores. E eles, a uma só voz, entoam esta canção mensagem: “Se não sabes como sair e a vida te faz em fanicos, nosso conselho hás-de ouvir: faz-te pobre e serás rico.”

Texto de uma pessoa em situação de “sem lar”
adaptado por Georgino Rocha
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