de Fernando Martins
Editado por Fernando Martins | Domingo, 17 Junho , 2007, 10:14

HISTÓRIA NA PRAIA DA BARRA



Há dias passeei com um amigo pela Praia da Barra. Inevitável ver o mar, com barcos que saem e entram. Há sempre quem goste de ver e que até se imagine dentro de um para correr mundo, prazer de tantos dos nossos conterrâneos que andam embarcados, e não só. Apesar do ventinho agreste, havia gente na praia, estendida na areia e à espera do sol benfazejo de mistura com o iodo da maresia. Não pisámos o areal, que não íamos à moda disso, nem é coisa do meu gosto, mas deambulámos por ali ao sabor das nossas recordações de tempos que nos encheram a memória de coisas agradáveis, nem sempre ditas a quem nos ouve.
Depois parámos em frente ao obelisco, assente num largo que tem o nome de um grande homem grande, alemão, e que deu trabalho a muita gente destes sítios. Roeder, assim se chamava e assim era conhecido o fundador do Estaleiro de São Jacinto, que os administradores que vieram depois não conseguiram manter de pé, por vicissitudes várias e próprias da crise industrial que entretanto surgiu. O nome dele aqui fica, como simples mas justa homenagem, embora um pouco deslocado do sítio onde muito trabalhou e viveu, dando exemplo de uma tenacidade rara.
O obelisco, agora mais bonito, depois do restauro por que passou, é uma lição de história. Não vi ninguém a ler, ou a reler, as legendas com referências à ria e barra de Aveiro. Nós lemo-las, e com que gosto. Quem dera que outros o façam, para ao menos ficarem a saber um pouco mais do chão que pisam e da terra onde vivem ou passam férias.

Fernando Martins
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Editado por Fernando Martins | Domingo, 17 Junho , 2007, 09:47

A CARTA AO REI ... E AS NINFAS



Caríssima/o:


Certamente que, chegado a Coimbra ido da nossa pacata aldeia, foram muito importantes os primeiros contactos e as relações estabelecidas com os companheiros de pensão da Couraça dos Apóstolos. De dois recordo o nome: o Medina e o Eduardo. O primeiro era o típico Dux de Coimbra cuja faculdade de medicina frequentava há tantos anos que até já nem sabia quantos! O quarto e os corredores pejados de livros que devorava até a aurora romper, eram a prova da bagagem cultural que à mesa espargia humildemente. Acordou quando o pai lhe comunicou de Moçambique que lhe ia cortar a mesada! Terminou o curso num relâmpago... depois de se habituar aos horários dos exames!
O segundo era um mocito ali dos lados de Mira e que um dia abalou sem deixar rasto. Certamente que terá continuado o comércio que seus progenitores lá exerceriam... E mais não sei. Contudo, as brincadeiras e as músicas que vivemos nas tardes de fim-de-semana não mais foram esquecidas...
Anos mais tarde, a Mira fomos uma vez cumprir uma promessa de minha Sogra,...
Agora me lembrei o que estava a ficar esquecido: as nossas idas de bicicleta para visitar a minha primeira professora, a D. Zulmira. Lá íamos, em grupo, pontificado pelo Hortênsio. Grande resistência física acumulávamos nas 'canetas' pois ir e vir no mesmo dia, upa, upa... Seria das sardinhas assadas que nos serviam de almoço?
Fiquemos então com lendas de Mira.


«Permitam que nesta série intervenha o vigário Tomé Nunes Pereira de Resende, através de um excerto da carta que escreveu ao rei José I, a 2 de Maio de 1758. Pois ele aí conta a lenda de S. Tomé debaixo da amieira.
É orago e padroeiro desta freguesia o glorioso apóstolo S. Tomé, bem conhecido e nomeado por S. Tomé de Mira, pelos muitos milagres que há tantos séculos está continuamente obrando, sem afrouxar nunca nem a devoção dos fiéis nem a protecção do santo em favorecer aos que se valem do seu patrocínio, como o está mostrando cada dia a experiência. Há tradição que esta sagrada imagem do glorioso S. Tomé aparecera debaixo de um tronco de uma amieira em uns bosques ou pauis que eram ribeiros e se compunham de várias amieiras e de outras árvores silvestres e, não fica muito distante da lagoa, ainda que, com alguma distância desta vila; e há também tradição que por aquele sítio aonde aparecera o santo, se lhe não podia fazer igreja, por razão das águas daqueles ribeiros ou pauis lhe impedirem, lha fizeram em um sítio chamado hoje o Outeiro da Forca, onde ainda se vêm os vestígios de algum tanto distante do sítio aonde aparecera a dita sagrada imagem, e que, colocando-se na nova igreja o dito santo incitou os sacerdotes daquele tempo para dizer missa e os fiéis para visitar o mesmo santo, o não acharam na dita nova igreja, mas sim naquele lugar aonde aparecera, até que desenganados que o santo só naquele sítio aonde tinha aparecido queria permanecer, para nele ser Deus Nosso Senhor maravilhoso nos prodígios que por ele havia de obrar, lhe fizeram uma igreja tal qual permitia aquele sítio, ficando o altar da capela-mor no mesmo lugar aonde o glorioso santo aparecera, e a dita igreja sendo matriz desta freguesia e o dito milagroso S. Tomé padroeiro dela que, ao depois foram acrescentando conforme ia dando aquele sítio.
No início do século XX a Praia de Mira não era como hoje é. O areal era mais plano e o mar invadia mais facilmente a barrinha e esta, nas cheias, facilmente ultrapassava a lingueta que a separava do mar.
Diz a lenda que nessas ocasiões, Neptuno e as filhas Tétis e Dóris, vinham baptizar as ninfas à barrinha. Elas, após a cerimónia, ficavam transformadas em sereias que depois se dirigiam para o Atlântico.
Só que um dia naufragou ali o barco de um pescador e uma das sereias não conseguiu alcançar o mar. Alcançou-a o pescador que se perdeu de amores por ela. E foram tão intensos os beijos que trocaram que ele morreu de exaustão e sede abraçado a ela.
Então, Tétis castigou a sereia convertendo-a numa ilha à saída dos moinhos da Videira, para que a doçura da água lhe absorvesse todo o sal. Já Dóris transformou o pescador numa duna branca em forma de golfinho com o rosto virado para aquela ilha que tem o nome de Zé Arrais.
Às vezes, de noite, escutam-se os sussurros que os dois extremosos amantes ainda trocam...»
[Viale Moutinho, pg. 148]


Manuel

Editado por Fernando Martins | Domingo, 17 Junho , 2007, 09:41
A CIMEIRA UNIÃO EUROPEIA-ÁFRICA
:
A África, com a sua magia, a sua floresta exuberante e a savana a perder de vista, o seu dia luminoso e colorido e a noite enfeitiçada, exerce fascínio sobre aqueles que por lá passam. E é sempre com um frémito que se aterra no aeroporto de Nairobi: por ali perto terá tido início a vida humana, por ali perto terá acontecido o salto milagroso do animal para o Homem, das vozes para a palavra, da oclusão do mundo para a emergência da luz da consciência.
Mas a África tem o condão dos extremos, como se estivesse ligada simultaneamente à inocência do Éden e ao terror do Apocalipse. A África subsariana transformou-se num campo de ruínas: fome, doença, analfabetismo, corrupção, colapso social, tiranias, sida, guerra, deslocados.
O drama da África é ter perdido a alma e a identidade. Foi lá que ouvi coisas temíveis. Disse-me um negro: "Com esta pele negra não se vai a lado nenhum." Outro atirou-me: "O vosso deus é mais forte do que os nossos - o vosso dá-vos tudo, os nossos deixam-nos na miséria."
Essa falta de confiança enraíza-se no tempo, essencialmente por causa da escravatura. O "tráfico dos negros", durante mais de três séculos, é uma das maiores vergonhas da Humanidade. No total, pensa-se que viveram escravizados pelo menos 20 milhões de africanos, pois no processo de escravização terão estado envolvidos uns 50 milhões, o que, como faz notar J. Moltmann, constituiu um dos maiores negócios de todos os tempos: os barcos circulavam permanentemente cheios, segundo este triângulo: armas e produtos da Europa para a África - escravos da África para a América - ouro, prata, açúcar, algodão, tabaco da América para a Europa.
Hegel, na sua filosofia da identidade, que absorve a diferença, não encontra lugar para a África. A História, que é a auto-realização de Deus, da Razão, caminha do Oriente para o Ocidente, pois a Europa é absolutamente o fim da História universal. A Ásia é o seu começo, mas a África "não é uma parte do mundo histórico": "O negro representa o homem natural, com tudo o que tem de indómito e selvagem."
Precisamente em Berlim, onde Hegel alcançou o cume da glória como filósofo, realizou-se em 1884 a famosa conferência que dividiu a África, não em função das realidades étnico-nacionais africanas, mas dos interesses coloniais.
Se, após a Segunda Guerra Mundial, os países africanos foram alcançando a independência política, isso não significou necessariamente melhoria das condições de vida das populações. Frequentemente, tudo piorou. Por exemplo, na década de 1990-1999, na África subsariana, o PIB por habitante caiu em média 0,2% ao ano e mais de 40% são pobres. Também porque, muitas vezes, dirigentes brutais esmagaram o povo e tornaram-se correias de transmissão de interesses de neocolonialismos.
Como acentuou o africano Kofi Annan, ex-secretário-geral da ONU, os dirigentes dos países em desenvolvimento têm de defender o primado do Direito, aderir ao mercado, combater a corrupção, garantir a estabilidade da economia, seguir políticas responsáveis, cobrar impostos de forma equitativa e transparente, responder às questões pelo combate democrático e não mediante guerras intermináveis, proteger o direito de propriedade.
Por sua vez, os países ricos terão de apoiar, retirando apoio aos tiranos e apoiando um comércio justo, que alivie as taxas de importação aos produtos desses países pobres, de tal modo que não tenham de enfrentar tarifas e quotas incomportáveis nem competir com produtos subsidiados dos países desenvolvidos. Precisa-se de mais investimento e ajuda ao desenvolvimento, mas terão de ser esses próprios países a auto-ajudar-se, com projectos simples e eficazes, que parecem milagrosos, como mostraram, por exemplo, Amartya Sen e Muhammad Yunus, "o banqueiro dos pobres", ambos galardoados com o Prémio Nobel.
A Europa tem responsabilidades especiais para com a África, sendo legítimo esperar que a próxima cimeira UE-África durante a presidência portuguesa da União seja bem preparada e obtenha resultados eficazes e duradouros.
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