de Fernando Martins
Editado por Fernando Martins | Sábado, 22 Maio , 2010, 08:55

 

 

 

Bento XVI em Portugal — 1

 

 

Anselmo Borges

 

 

Fica aí o que, na minha perspectiva pessoal - as visões puras e neutras não existem -, o Papa disse de essencial na visita ao País. Retomarei o tema, em jeito de balanço, no próximo sábado.

 

1. Ainda no avião, foi frontal quanto à pedofilia, afirmando que "a maior perseguição à Igreja" não vem dos "inimigos de fora, mas nasce do pecado da Igreja". Face a esta questão "verdadeiramente aterradora", a Igreja precisa de "reaprender a penitência, aceitar a purificação, implorar o perdão" e vai colaborar com a justiça dos Estados.

 

2. Em plena celebração do centenário da República, afirmou a importância da separação da Igreja e do Estado. "A viragem republicana abriu, na distinção entre Igreja e Estado, um espaço novo de liberdade para a Igreja", que está disposta a "colaborar com quem não marginaliza nem privatiza a essencial consideração do sentido humano da vida". Os católicos devem intervir publicamente, pois "não se trata de um confronto ético entre um sistema laico e um sistema religioso".

 

3. No Terreiro do Paço, sublinhou que a fé cristã não se apoia nas estruturas, mas no Cristo vivo. Ele é a resposta para as questões radicais da existência: o amor, o sofrimento, a morte, o sentido último. Apelou a que cada cristão e cristã seja "uma presença irradiante da perspectiva evangélica no meio do mundo, na família, na cultura, na economia, na política" e exortou os jovens a serem testemunhas da alegria de Cristo, reconhecendo-o também nos pobres.

 

4. No encontro com o mundo da cultura, reflectiu sobre a sociedade que, ao absolutizar o presente, cortando-o do património cultural do passado, não é capaz de delinear um futuro. Este "conflito" entre a tradição e o presente encontra a sua expressão na "crise da verdade", quando só ela "pode orientar e traçar o rumo de uma existência realizada".

 

Para o cristianismo, Jesus Cristo é a verdade eterna encarnada. Mas a Igreja, "na sua adesão firme ao carácter perene da verdade", está a fazer a aprendizagem da convivência com "o respeito por outras 'verdades' e com a verdade dos outros". Precisamente deste respeito em diálogo "podem abrir-se novas portas para a comunicação da verdade". Para quem põe em causa o Concílio Vaticano II ficou a afirmação da sua importância para a abertura da Igreja ao mundo e à modernidade.

 

As pessoas deverão olhar para lá das "coisas penúltimas" e pôr-se à procura das "últimas". E ficou esta afirmação como emblema desta viagem: "tornai as vossas vidas lugares de beleza".

 

5. Em Fátima, depois daquela oração de imensa ternura: "venho como um filho que visita a sua mãe", quis, como teólogo, recentrar o cristianismo: o seu centro não está em Maria, mas em Jesus Cristo. Quem descobre Deus que é amor, revelado em Cristo, descobre o fundamento da esperança e age em consequência: abandona o altar dos egoísmos mesquinhos e abre-se à solidariedade fraterna universal.

 

Aos bispos disse que não podem ser "apenas pessoas que ocupam um cargo", pois são responsáveis pela abertura ao Espírito. A sua autoridade é de serviço ao crescimento dos outros, na lógica do dom. Defensores dos direitos inalienáveis da pessoa humana, devem revigorar neles e ao seu redor "os sentimentos de misericórdia e compaixão capazes de corresponder às situações de graves carências sociais", junto de todas as pobrezas, incluindo as de falta de sentido e esperança.

 

No encontro com as organizações da Pastoral Social, reafirmou que o cristianismo se centra no Deus que é Logos (Razão) e Amor. Assim, quem ama Deus deve amar, com amor inteligente, gratuito, generoso e eficaz, o que Deus ama: a criação e todos os seres humanos, privilegiando os mais pobres.

 

6. No Porto, deixou esta palavra: "A Igreja nada impõe, apenas propõe", e, reconhecendo que se alterou o quadro antropológico, cultural, social e religioso da humanidade, apresentou a missão da Igreja: "é chamada a enfrentar desafios novos e está pronta a dialogar com culturas e religiões diversas, procurando construir juntamente com cada pessoa de boa vontade a pacífica convivência dos povos".

 

In DN


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