Alberto Martins
17 de Abril de 1969
Maria Donzília Almeida
Decorria o ano da Graça de 1969 em Coimbra, onde me encontrava como caloira, na urbe universitária. Todos os dias subia os degraus daquele extenso patamar que dava acesso à Faculdade de Letras. Mesmo em frente, erguia-se imponente a estátua de Minerva, que parecia dar as boas-vindas aos estudantes. Eu, uma novata e amante do exotismo estrangeiro, ouvia, sempre, nessa saudação, a palavra welcome reescrita e transposta para o acesso à entrada da minha actual “Home, sweet home”.
Coimbra era uma cidade a latejar por todas as suas artérias, desde a parte alta onde se situava a velha academia, até à baixinha onde o comércio prosperava e se alimentava da massa estudantil.
Com a chegada da Primavera, numa época em que as estações do ano tinham a mesma definição das estações do caminho-de-ferro, toda a gente sabia quando e onde estavam, o ar impregnava-se de aroma a madressilva e rosmaninho e as noites convidavam a passeios relaxantes. A juventude estudantil dá vida, movimento, e significado a uma cidade. Foi neste contexto humano e climatérico, que alvoreceu o dia 17 de Abril Um novo edifício do campus universitário ia ser inaugurado e toda a academia contava com a presença do Chefe de Estado, na altura o Almirante Américo Tomás, para abrilhantar o evento. A comitiva oficial esteve no local à hora marcada, apenas com um contratempo. Um grupo de estudantes, que há muito congeminava esta insurreição, ousou afrontar o Presidente da República, apelidando-o de atributos pouco dignificantes. A reacção do poder institucional não se fez esperar, tendo-se procedido à detenção dos estudantes desordeiros. A partir daí, exaltados os ânimos com aquilo que chamavam de opressão fascista, gerou-se uma onda de contestação e foi organizado um movimento de contra-poder. Os jardins da Associação Académica foram o palco das reuniões magnas de estudantes, que a partir daí ocorriam com regularidade. Como havia sido decretada greve geral aos exames da 1ª época, reinava um ambiente de descontracção alimentado pela filosofia dos Hippies que defendia a ideia do “Make love not war!” Com a envolvência da noite morna de Coimbra, no cenário luxuriante dos jardins da Associação, ao som da voz quente de Zeca Afonso e sua guitarra… criava-se o ambiente! Geraram-se intimidades, cumplicidades... que culminaram no alargamento demográfico da população portuguesa! Os jovens, de então, eram tão pacifistas (!?) que... preferiam envolver-se em actividades mais satisfatórias, que as guerras frias e sem sentido! Seguiam à risca o slogan Make love...! Os líderes desse movimento de contestação à política da altura....estão hoje, em lugares de destaque na sociedade e na política actual......mas ficaram muito aquém dos ideais revolucionários que outrora defenderam e por que pugnaram. 15.04.10