PELO QUINTAL ALÉM – 9
A NESPEREIRA
Aos
Rapazes da Escola
Caríssima/o:
a. Ora aí está uma árvore muito apreciada pela sua folhagem. No nosso quintal somos brindados com a presença de umas três ou quatro, embora de desenvolvimentos diferentes.
e. Não era uma árvore muito abundante pelas Gafanhas de outrora...
i. Para além do gosto especial da nêspera apreciávamos os “caroços”... e não me perguntem por quê...
À madeira também não lhe dávamos grande valor: lume, tão-só!...
o. Nas aplicações medicinais é que é uma fartura; vejamos:
Utilidades Medicinais:
Adstringente - Preparar o decocto da casca da nêspera e aplicar externamente em cataplasmas.
Amigdalite - Proceder como indicado em anginas.
Anginas - Gargarejar com o chá da casca da nêspera. Usar 40 gramas da casca fresca ou 20 gramas da casca seca para um litro de água.
Diarreia - Recomenda-se fazer uma refeição de nêspera cozida com torrada. Pode-se também tomar o caldo do cozimento de nêspera de hora em hora na quantidade de 1/4 de xícara.
Diurese - Fazer refeições exclusivas de nêspera.
Estomatite - Proceder como indicado em anginas.
Ou seja: Ajuda a tratar de: eliminação de toxinas, escorbuto, estados febris, problemas digestivos (azia, acidez, gastrites, úlceras etc.), regularização do ácido úrico, retenção de líquidos.
Não é em vão que o povo diz: «Deus criou uma erva para cada doença».
Acresce ainda que há sempre uma jovem que "descobre" que o chá de nespereira faz emagrecer!...
u. No campo da lenda e do mito, vamos hoje aos Açores:
“Nos Açores temos as “mónicas”, magnólias ou nêsperas. Essa fruta vem das nespereiras, plantas da família das rosáceas que segundo histórias antigas são oriundas da China.
Conta a história que, naquela época das Descobertas, de cortesias e cerimónias oportunistas, foram os marinheiros portugueses aconselhados a levar consigo para a China uma roseira. Para aliciar os Chineses, no seu encontro, com muitas vénias, obrigados e com licenças, julgaram poder dessa forma derrubar os muros que separavam as nossas duas culturas.
Os Chineses, como os Alemães, correctos e discretos, de poucas palavras agradeceram a oferta sem expressarem qualquer comoção. Dois dias mais tarde, à partida das caravelas, de novo num curto encontro diplomático, entre muitas vénias e reverências, entregaram como oferta de partida uma nespereira.
Acontece que os Chineses tinham realmente ficado indignados com aquele presente da roseira; uma planta cheia de espinhos, que fere quem a toca! Não acharam mesmo nenhuma graça à oferta dos Portugueses. Até terão pensado que os Portugueses de uma forma chicana os insultavam. Por isso escolheram uma nespereira, a fruta que para eles era venenosa, e com a mesma formalidade e pompa dos “olhos grandes, barbudos e narigudos Lusos” deram aos Portugueses o presente que julgavam apropriado pela nossa afronta.
Mais tarde, a roseira deu botão e encheu-se de flor. Surpreendentemente impressionados, trataram de mandar um mensageiro para o posto português mais próximo para avisar os Portugueses que não comessem da fruta da nespereira, que era “peligoso. Muito peligoso.”
Quando o aviso chegou, porém, já os Portugueses tinham provado das “mónicas,” como se chamam as nêsperas em algumas localidades dos Açores. Acusavam um pouco de destempero dos intestinos realmente quando comiam um pouco mais dessa fruta, especialmente se comidas com leite, mas não assim tão “peligosa” como isso; de forma que continuamos a comer da dita fruta, abundante no mês de Setembro, na mesma altura que lá longe na China as rosas entram em botão e encantam os Chineses com o seu colorido aveludado e perfume de Nirvana.
Assim, quer na China, quer nos Açores uma rosa é uma rosa apesar dos picanços e as nêsperas são nêsperas, apesar de ácidas.
A moral do conto é que grande beleza, assim como grande sabor se esconde entre espinhos e venenos; há que aceitar tudo com um espírito de abertura ou em boa fé, pois entre agruras e picanços se escondem grandes tesouros. A outra lição é que não devemos julgar as acções dos outros antes dessas darem flor ou fruto; a boa fé por boa fé se troca.
Manuel