As quebradas dos montes vinham juntar-se em baixo, suavemente, segredando o caminho do rio.
Os refegos, acastelados, ficavam no horizonte, como panejamentos de cores suaves, onde havia cinzentos fimbrados de moreno baço com laivos de neve, tão branco se tornara o nevoeiro com o contacto da luz do sol. Nos primeiros planos das dobras dos montes ainda de desenhavam copas de árvores em borrão; mas, lá adiante, só ficava o dentado dos cerros mais altos em caprichos de formas. E aldeias espalhadas. Porto Antigo e do outro lado do Avestança, Souto do Rio. Depois Buaças, lá longe, onde os homens trazem tatuado nos braços um sino-saimão.”
Alves Redol
In Porto Manso
Para todos os que cuidam
Na apresentação do livro, Manuel da Cerveira Pinto Ferreira diz, com graça, que “Boassas há uma. Apenas esta. Não é, pois, como os chapéus…”. E logo adianta, ao jeito de quem quer abrir-nos o apetite: “Consta, com alguma base histórica, que o Autor defende, que o seu nome provirá de um árabe importante que, antes da reconquista, por cá viveu ou estadeou: Abolaças.”
Por sua vez, o Prof. Doutor António Jacinto Rodrigues, catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, sublinha, na nota que antecede a obra propriamente dita, que “BOASSAS – Uma aldeia com história” se apresenta como “um trabalho de rigor e notável erudição”. E salienta, logo a seguir, o levantamento feito pelo autor do “património riquíssimo daquela área”, com “referências arqueológicas e etnográficas”, enquanto revela “edifícios de importância patrimonial”.
Para aquele catedrático, “esta excelente monografia de Boassas revela não apenas um acervo documental do património local mas abre pistas para um enquadramento de estratégia cultural e histórica cheio de potencialidades”.
Foi, pois, com estes esclarecimentos iniciais, que se tornaram desafios, que li e reli as 180 páginas desta obra, preparada com arte, muito bem ilustrada e com notas bibliográficas e registos de rodapé de suma importância para os estudiosos e interessados pela história das nossas terras e gentes.
Viajei, então, graças ao trabalho de Manuel da Cerveira Pinto, por aquelas bandas com Douro à vista, desde a pré-história aos nossos dias. Calcorreei os caminhos de Boassas, familiarizei-me com apelidos que fizeram história, passei por monumentos e casario de várias épocas, senti a religiosidade do povo, saboreei lendas e tradições que perduram, umas, e se foram, outras. Os usos e costumes foram-me contados com graça e até com ternura, adivinhei superstições e apreciei a gastronomia, marca indelével do ser e viver de gentes que preservam a identidade da sua região.
Figuras históricas e políticas, do passado e do presente, pessoas simples e populares, artesanato e arquitecturas, casas nobres e roteiros turísticos podem visitar-se, graças ao excelente trabalho de Manuel da Cerveira Pinto, um dos quatro filhos do meu amigo, de banca meu companheiro, Manuel da Cerveira Pinto Ferreira.
Os meus parabéns para quem concebeu e fez esta obra, com votos de que ela sirva de estímulo a quantos cuidam da preservação da nossa identidade, em tempos de globalização, que tudo é capaz de diluir, na voragem dos interesses económico-financeiros.
Fernando Martins